26 setembro, 2007

Alma Gêmea. (parte VI, o início).


Em todos os povos que se tem notícia, nos presságios dos profetas de todas as raças nos inúmeros planetas que vagueiam pelo universo, o caminho à chama divina é o mesmo quanto ao sentido da iluminação. E o que é experimentada pela alma, ainda que seja em débil grau, mesmo que se passem séculos, a experiência é reconhecida por todos, pois o canto da alma jamais é esquecido.

Nos cantos em mantras na melodia dos tempos antigos; nas misturas de cores inimagináveis em tons que vibram energeticamente emanados de calor; em odores profundos que perfumam a alma, selvagem e liberta; aromas quase palpável sustentam o corpo físico sobre o vento fresco no balanço do sonho; O espírito vagueia ao som do vento.

Mas algo mudou neste cenário exótico: luzes, raios e estopins ensurdecedores faiscavam em sua face. A nave envelhecida pelo tempo que sobreviveu a situações limite, mais uma vez era colocada à prova no sustento de seu ocupante. A força gravitacional puxava a nave rapidamente e nada podia fazer sem os seus aparelhos já danificados, a não ser, usar todos os seus conhecimentos de navegação e torcer para encontrar um lugar que pudesse descer sem grandes estragos.

Por entre as nuvens apareceu um manto verde de vegetação selvagem que cobria todo o horizonte. Milhares de rios se cruzavam indo ao encontro do mar; pássaros de diversas cores e tamanhos, ao longe, indiferentes, voavam de um lado a outro, majestosos; montanhas surgiam do manto verde e desafiavam as alturas formando uma verdadeira muralha viva; em todo o horizonte, a vida surgia a cada instante em grande gloria como se uma grande mágica acabasse de nascer.

O navegante já não sentia a nave tremer, e prevendo o pior, colocou o capacete que lhe cobria da nuca ao pescoço. Ainda sim, o esforço para nivelar a nave era grande e inteligentemente apontou-a para o litoral. Pelo menos - pensou, a água amorteceria grande parte do impacto.

O estrondo foi grande. Pássaros de diversos tipos e tamanho voaram assustados de um lado a outro; animais em pavoroso fugiram sem saber do quê, e em seguida, um absoluto silêncio imperou naquele cenário verde e selvagem.

Tonto, ainda nadou até a praia, onde cambaleando, tirou o capacete e deixou-se cair sobre a fina areia da praia. Sua pela era negra e cicatrizes na face indicavam uma vida dura que tinha vivido. Ficou ali sentindo um cheiro estranho e um gosto salgado na boca; Descobriu mais tarde que a água era composta de uma grande quantidade de sal e iodo e tinha uma incrível capacidade de possuir uma reação química de oxidação em seus aparelhos eletrônicos, ou seja, queimava sem chamas.

O céu era de uma azul intenso fazendo-o contrair as vistas; e a mata fechada lhe trazia dúvidas o que poderia estar lhe espreitando. Pensou no pior.

Assustou-se quando a face de uma mulher apareceu em sua visão cobrindo-o com a sombra de seu corpo. Marramed Phaibe chegou a emitir um estranho som arrastando-se para trás. A mulher continuava ali, o observando com certa curiosidade e, estranhamente, sem medo algum, apontava para o céu e depois para a nave que afundava deixando escapar muita fumaça. Parecia dizer alguma coisa. Foi aí que se lembrou que tudo aquilo que poderia lhe ajudar na sobrevivência naquele planeta acabava de afundar, inclusive, o codificador de idiomas se bem que, era uma linguagem bastante primitiva da mulher, com base em sons ilógicos e gesticulações simplórias.

Encantou-se de imediato com aquela mulher aparentando seus vinte e três anos. Ainda que se movimentasse bruscamente, demonstrava uma candura contagiante, e os olhos, grandes e ágeis, transparecia uma inteligência adormecida. Marramed era um homem alto, porém, ainda que sua raça chegasse aos três metros vinha de uma geração de damalianos baixos com seus dois e meio no máximo, mas ela, alta, ainda que andasse curvada, morena, carregava em seu biótipo um corpo grande e forte e, incrivelmente, uma grande agilidade em seus movimentos. Descobriu com o tempo, que ela possuía uma grande generosidade que nunca tinha visto por onde havia passado antes. O carinho que prestava aos pequenos animais em sua volta era de uma dedicação exemplar.

Passou-se uma semana antes que ela lhe apresentasse ao seu povo que o recebeu com certa desconfiança por causa daquela vestimenta estranha de côr brilhante colada ao corpo. Mas rapidamente, com ajuda de seu intelecto, as invenções que fizera tanto na guerra com outras tribos como na agricultura, engenharia e na medicina, só aumentou não só a confiança, mas lhe deram um cargo de alta responsabilidade que equivalia ao de um médico. Passava o dia dividindo o tempo com a comunidade e o conserto de sua nave; muito danificada pelo tempo que em ficou na água do mar. Se conseguisse fazê-la voar, conseguiria chegar a sua casa pois já tinha a rota traçada em seus registros. Quanto aos nativos, o chefe pediu apenas que a deixasse longe da tribo, num campo de pouca vegetação, pois no resgate que fizeram, um homem morreu afogado e o chefe achava que a nave era de mau agouro.


A medida que as experiências eram expostas entendia a importância da coletividade. A vida humana estaria fadada a um nível animal se tivesse usado apenas os seus impulsos instintivos e inconscientes, mas foi despertada da inconsciência para iniciar a construção de uma norma comunitária que se tornou o fundamento das civilizações e culturas.

A medida que os costumes em grupo são aperfeiçoados e a consciência humana cresce, a luta pela existência física perde o papel dominante de suas normas diárias. A autodefesa individualizada é trocada por uma responsabilidade em defesa da comunidade. Alguns insetos são assim como as formigas, abelhas e certos tipos de cupins -, observou. Marramed Phaibe notava sistematicamente a mudança e se sentia culpado de ser a causa da aceleração desse processo, que normalmente, levaria centenas de anos.



Escutou gritarias animalescas ao longe. Cruzou a pequena aldeia seguindo o foco da atenção de todos e pôde observar que uma tribo visinha clamava por vingança referente a uma briga anterior a sua chegada. Entendeu que, quando duas tribos cruzassem o caminho uma da outra e ambas escolhessem o mesmo lugar para permanecer, os dois guerreiros mais fortes se confrontariam até a morte. Quem vivesse levaria tudo, inclusive as mulheres.

Um homem de aparência rude levantava a sua lança ameaçadoramente olhando para o guerreiro da tribo vizinha que era quase o dobro de seu tamanho. Este homem era irmão daquela linda mulher que parecia não querer que houvesse o duelo. O pai, chefe da aldeia, balançava a cabeça parecendo ser forçado diante de suas próprias leis.

Marramed Phaibe sabia que aquele rapaz não teria nenhuma chance, e sentindo certa preocupação pelo fim daquela tribo que simpatizara profundamente, gritou ferozmente levantando os braços. Todos o olharam e estranharam quando aquele homem de cor escura, diferente deles, pegou a lança da mão do rapaz que muito a contra gosto a entregou, e caminhou em direção ao chefe. Não foi muito difícil de explicar que queria tomar o lugar do rapaz. O chefe, olhando para o filho, acenou afirmativamente mostrando-se aliviado. E antes de se virar em direção ao seu oponente, notou que a mulher o olhava surpresa. Os olhos brilhantes e acentuados se enchiam de lágrimas parecendo perguntar "por quê?". E ele pareceia entender as lágrimas da mulher mesmo não compreendendo o que estava fazendo ali, com aquela lança, prestes a enfrentar um guerreiro que já estava acostumado a fazer aquilo: matar.

O grande guerreiro o olhou de cima abaixo tentando entender se aquilo que brilhava ao sol era a sua pele ou uma espécie de roupa, pois no momento, imaginava que aquela face negra era uma espécie de tinta negra para a ocasião de luta.

Marramed Phaíbe tinha certeza agora; sentia alguma coisa forte por aquela mulher.

08 setembro, 2007

Alma Gêmea. (parte V, o início).


No início, a vida em sua maior aspiração, eclodiu em pulsos rítmicos as mais simples formas de vida emanadas por um campo elétrico de baixa densidade. Há cada eclosão, minúsculas partículas de vida foram lançadas ao universo predestinadas a um dia voltarem ao ponto de origem. Estes pequenos campos elétricos, em suas essências mais sutis, gotas translúcidas de vida, iniciaram daí uma jornada subordinada a regras de causa e efeito com a única finalidade de evoluir. Por isso, tudo que existe evolui para melhor, pois o ambiente está sempre forçando a vida adaptar-se.
O equilíbrio da ação e reação foi abalado quando a luz do conhecimento se fez presente.
A luta passou a ser mais acirrada e uma corrida de sobrevivência surgiu. Almas perdidas e aturdidas numa escuridão vazia e fria passaram a vagar almejando a independência da criação. Porem, almas fiéis aos preceitos de sua existência, almejando a continuidade daquilo a que foram predestinadas, resistiram duramente buscando o equíbrio em que sempre viveram.
Na eclosão da vida, todos estes filetes que nasceram juntos em um mesmo momento, numa mesma vibração, no mesmo posicionamento entre planetas influenciados por seus campos gravitacionais, passaram a ser interligados ainda que a distância fosse grande. Com os distúrbios do desequilíbrio muitas almas se distanciaram, mas ainda sim, sempre ficaram ligadas através do tempo e do espaço. São chamadas de almas gêmeas.

Randorz tinha esse conhecimento porque o povo damaliano passava de pai pra filho através dos tempos remotos de sua civilização. Sabia que todo ser de alguma forma distribui pelo universo a essência de sua existência: na reação ou em sua ação.

Dharmilo deixou clara a finalidade do projeto: Facilitar o contato de duas almas que sempre viveram em mundos diferentes, que sempre evoluíram em rítimos diferentes, mas ainda sim, interligados num fluxo orquestrado pela criação.

- Conseguimos identificar o seu aluno. – Falou Dharmilo cortando o silêncio do quarto.
Perguntou: - Já decidiu se abre os braços para o seu destino?
- Qual o planeta?
- No quadrante de Ur, na parte deserta. É um planeta que orbita uma só estrela. Os habitantes estão vivendo o início da propulsão imantada.
- Então ainda são carnívoros. – Disse ficando de costas para a grande janela.
- Todos vocês vão ficar na distância e manter contato mentalmente com eles.
- No quadrante de Ur tem poucos planetas habitados.
- Um próximo a estrela de Ur tem. Os habitantes chamam de Terra.

Randorz olhava novamente aquela paisagem de pouca vegetação. Agora, parecendo um estranho entardecer, as sobras surgiam como fantasmas dos habitantes que um dia, ali viveram. Via ao longe, grande e majestosa, a lua daquele planeta. E mais além, um planeta vizinho.
Uma coisa era certa: iria ao encontro de alguém que de alguma forma, era parte dele.

Saudações

A verdadeira religião, é a do coração.